terça-feira, 5 de agosto de 2014

Lunar - Capitulo 1

Lunar Capítulo 1

 Belita
"Contar história não é minha vocação.
Certamente teria nenhuma, se não fosse a história que vou contar-lhes.
Um típico caso de dialética.
Boa parte desta história eu presenciei, outras ouvi falar, outras eu inventei mesmo, afinal de contas quem conta um conto, aumenta um ponto.
Afim de evitar qualquer confusão, eu já vou informar que sou uma gata.
 É! Gata e ponto!
 Alguns de vocês devem julgar-me presunçosa; não se trata disso, sou uma gata de verdade, uma felina de quatro patas, peluda, de bigode e olhos com íris em forma de fenda vertical; uma gata siamesa.
Antes que parem de ler, posso garantir-lhe que a história que vou contar é muito séria, não se trata de uma fábula, mas de uma trajetória de vida, não da minha, mas de meu dono; se bem que durante muito tempo pensei que eu fosse dono dele; uma trajetória que inclui a explicação do porque sou capaz de conversar com você.
Bem, a melhor forma de começar uma história é pelo começo."

Carlos
21 de abril, 20:00.
Primeiro vôo comercial brasileiro para Lua.
A data de comemoração do descobrimento do Brasil foi escolhida com esmero.
Na Base de Lançamento de Astronaves de Alcântara centenas de autoridades participavam do coquetel de lançamento.
Na sala de controle de vôos os técnicos e engenheiros estavam apreensivos, eles precisavam de pelo menos mais onze dias para fazer todas as verificações e acertos da nave.
Carlos Santos, supervisor do Centro de Controle de Vôo Aeroespacial, estava rodeado de dezenas de telas enormes, técnicos e engenheiros que monitoravam o Ônibus espacial Zumbi; fabricado totalmente no Brasil, com tecnologia nacional.
- Carlos, estão te chamando no Salão Amarelo. O Presidente quer conhecê-lo! - Avisou Cíntia, a relações pública da base.
- Diga-lhe que estamos em plena atividade, tomando providências importantes para o lançamento da Zumbi.
- Você vai fazer esta desfeita!?
- Não posso participar de coquetel de lançamento agora, em pleno expediente!
Cíntia saiu consternada.

- Quero conhecer o homem que não atendeu meu convite! - Disse o Presidente ao entrar na Sala de Controle, acompanhado de Ministros, Senadores e Deputados.
- Excelência eu lhe expliquei, ele está muito ocupado! - Balbuciou Cíntia.
- Deixe comigo Cíntia, - disse Carlos - eu tenho certeza que o Presidente me entenderá.
- Sr Presidente, Carlos dos Santos, supervisor da missão. - Apresentou Cíntia constrangida.
- Prazer em conhecê-lo Excelência! - Cumprimentou com um aperto de mão - Infelizmente não posso participar do coquetel. Vou mostrar-lhe minha justificativa.
Tamara avise a nossa equipe que vamos fazer uma explanação para o Presidente, prepare uma vídeo conferência.
O Presidente olhou para Carlos com admiração.
- Carlos a cabine de comando da nave está pronta. - Avisou Tamara, engenheira de comunicação.
- Coloque no telão.
Nos telões que mostravam as rotas de vôo de todas as naves em curso na atmosfera, e outros diversos dados metereológico, de telemetria, etc; um deles exibia a cabine de comando da Zumbi.
- Boa noite! Algum problema Carlos? - Perguntou Sidney, comandante do vôo.
- Sem problemas. Estamos com o Presidente e sua comitiva, o que pode nos dizer do andamento da missão.
- Boa noite Excelência! Estamos na fase de revisão de procedimentos. A piloto Cristina está estudando a rota, simulando possíveis problemas e provendo soluções. Juliano, o co-piloto, está verifcando os procedimentos de atracação com a Estação Espacial Internacional, onde reabasteceremos. E temos vários técnicos fazendo verificações as mais diversas em toda a nave.
- Parabéns Sr Sidney, boa sorte! - Disse o Presidente.
- Temos mais equipes prontas! - Ressaltou Carlos.
- Exato! - Confirmou Tamara - A engenharia mecânica, as telecomunicações, comissárias de bordo, entre outros.
- O que vi é uma excelente amostragem do bom trabalho feito aqui. Parabéns a todos! - Disse o Presidente.
- Tamara finalize a vídeo conferência! - Disse Carlos - Sr Presidente espero que entenda o motivo de não poder me ausentar.
- Compreendo perfeitamente! Mas não deixem de ir ao coquetel, vocês mais que qualquer outro merecem estar lá.
Cíntia sorriu aliviada.
Carlos sorriu satisfeito.
A comitiva voltou para o coquetel.

Thomas
A grande atração do coquetel era Diva Estelar, dançarina do Grupo Ritmo Brasil.
O Grupo é um grande sucesso e fará a primeira apresentação de um grupo musical ao vivo na Colônia Lunar Santa Cruz. Além de Diva compunham o grupo Xicoh Green, vocalista e guitarrista, e Tião Batucada, percucionista; os outros músicos eram contratados conforme o evento, no caso da apresentação em Santa Cruz os outros músicos tocariam em Terra e suas imagens serão projetada em 3D, como era comumente feito, por todo o grupo, quando se tratava de evento na Lua, pois não havia vôo regulares, saindo do Brasil.
Mas para o vôo inaugural, Thomas Gringh, o maior empresário da Lua, e grande investidor em Santa Cruz, encomendou este espetáculo e fez questão da presença de Diva.

Diva
O vôo de carreira inaugural levará apenas 102 passagieros pagantes, mas o Grupo Ritmo Brasil e a equipe técnica composta por 15 pessoas, a comitiva de Thomas Gringh 23 pessoas, e convidados do governo, ministros, senadores e deputados, 36 pessoas.
A tripulação era formada pelo comandante Sidney, a piloto Cristina e o co-piloto Juliano, 3 comissários e 6 comissárias de bordo. No total 192 pessoas.
Todas estas pessoas, mais os parentes e amigos que foram se despedir, participavam do coquetel.
- Senhoras e senhores, temos a honra de anunciar a presença da equipe de controladores de vôo no camarote presidencial!!! - Anunciou o locutor.
Todos os presentes se voltaram para o camarote presidencial, equipe chefiada por Carlos se aproximou da mureta que os separava do público e fez um aceno.
Foram aplaudidos longamente.
Ainda durante os aplausos, Carlos viu por um dos telões que exibiam a Zumbi um helicoptero se aproximar da nave.
Afastou-se dos presentes e entrou em contato com o controle.
- Controle, quem autorizou o vôo do helicoptero proximo a Zumbi?
- Carlos estamos atendendo um pedido de Thomas Gringh, não sabemos o motivo, mas ele pediu para ver a nave de perto antes de embarcar.
- Respondeu o técnico no plantão.
- Minha nossa!!! Ele tem uma garrafa de champanhe, não acredito que ele vai jogar bebida na nave?!
- Parece que ele vai jogar a garrafa!!! - Disse o técnico assustado.
Carlos correu ao encontro do Presidente.
- Sr Presidente, aquele helicoptero não podia está na área de lançamento!
- Eu sei, mas o Thomas insistiu, o ministro da aeronautica não encontrou impecílio...
- Ele vai lançar uma garrafa de champanhe na nave, pode danificar um dos muitos sensores que existe na fuselagem. Dependendo do estrago vamos ter que adiar o lançamento por vários dias. Fora o prejuízo!
O Presidente entrou em contato pessoalmente com Thomas.
- Thomas! Não jogue nada na nave!
- Sr Presidente, é uma tradição de séculos, é uma inauguração!!!!
Carlos percebeu a presença de Diva no helicoptero junto a Thomas.
- Ele vai impressionar mais a moça se não atrapalhar o lançamento! - Comentou Carlos com o Presidente.
O Presidente assentiu com desaprovação ao Thomas.
- Estou com o Supervisor da Sala de Controle, sua atitude pode adiar o vôo por dias.
- Mas uma nave que custou milhões, não suporta o impacto com uma garrafa de vidro, como vai transpor a atmosfera!
- Sr Presidente com a sua permissão, posso falar com ele?
- Claro. - O Presidente lhe passou o aparelho.
- Sr Thomas, a nave está pronta para ser lançada...
- Quem está falando? - Thomas percebeu a mudança de voz.
- Carlos, supervisor do vôo!
- Não vou ouvir sermão da equipe técnica!!!
- Sr Thomas, no lançamento precisamos de todos os sensores, depois eles são recolhidos e protegidos. Não podemos correr o risco de perdermos nenhum neste momento.
- Thom, - disse Diva - não precisamos correr este risco.
O helicoptero se afastou da nave.
- Agora sabemos quem está no comando! - Comentou Carlos com o Presidente.

22 de abril, 00:01.
Depois de uma jornada de trabalho de oito horas, e mais uma hora que esteve no coquetel, Carlos chegou em sua casa e foi direto para seu escritório oficina.
- Belita!
A gata [Belita] aproximou-se dele.
- Hora de salvar os dados da missão!
Carlos transferiu os dados de sua mídia móvel, para uma mídia afixada na coleira da gata.
Ele sabia que este não era o método mais seguro, e este era só uma das modalidades de back up, por isso já estava trabalhando num sistema de implante cerebral, para guardar as informações em seu próprio cérebro.
Insone ligou para seu irmão, Claudio dos Santos, que mora na Lua desde o começo da colonização.
- Olá Claudio! - Saudou o irmão.
- Olá Carlos!
- Estive com o seu padrão hoje, na verdade ontem - corrigiu ao conferir a hora.
- Qual o Presidente ou Thomas?
- Com os dois.
- Está importante heim! Faz mais de cinco anos que não tenho contato com Thomas, e o com Presidente nunca estive pessoalmente.
- Na verdade não há mérito algum da minha pessoa, só trabalho.
- Sempre somos digno de algum mérito! - Disse Claudio.
- Mérito tem você, que trabalha há trinta anos para Domex ajudando a colonizar a Lua.
- Mas este tempo está chegando ao fim, este ciclo está se fechando, mês que vem completo 70 anos, e terei que aponsentar.
- Que vai fazer da vida?
- Vamos ver, tenho muitas idéias.
- Volte para Terra, um profissional com seu currículo é sempre bem vindo.
- Venha para Lua, e me ajude a por minhas idéias em prática.
- Não. Meu negócio é mandar gente para Lua.
- E o meu é cuidar que se sintam bem aqui.

22 de abril, 07:00.
Carlos chegou cêdo à sala de controle.
Em dia de lançamento quanto mais cedo chegar melhor.
Foi um lançamento perfeito, apesar do tempo exíguo.
Após uma breve comemoração no Centro de Controle, Carlos foi para sua sala, para se dedicar a volta da Zumbi e demais projetos que eram executados pela Centro de Lançamento.
Cíntia bateu a sua porta e ele autorizou entrar.
- Thomas Gringh não gostou nada de você tê-lo impedido de inaugurar a nave.
- Cintia, esse assunto de novo? Ele poderia está em sérios apuros agora, se eu não tivesse impedido, talvez até morto, ele e todos que estão na nave agora.
- Ele disse que você sofre da Síndrome da Challenger, e não viu motivo para tanto alarde.
- Excesso de zelo é melhor do que peso na consciência! – Disse visivelmente irritado, mas contido – Se o assunto era esse, está encerrado!
- Acho melhor não dizer não para ele de novo!
- Ele mandou dizer-me isso?
- Não, é só uma dica de quem viu-lo esbravejar, e transpirar ódio ao falar seu nome. Se ele não estivesse tão encantado pela jovem Diva, talvez tivesse pedido sua cabeça.
Cíntia saiu da sala, e deixou Carlos com mais uma preocupação.
Ele olhou para o telão que registrava a telemetria da Zumbi, sua trajetória perfeita, os registro todos dentro da normalidade, lhe deram a certeza de que tinha feito o que tinha que ser feito. Por mais tradicional e requintado que pareça, uma fina camada de qualquer líquido que não tenha sido testado, pode se transformar em um foco de falha.
- Os anéis de vedação... quem iria imaginar! – Falou sozinho em voz alta, e voltou a trabalhar.